sábado, 13 de dezembro de 2014

O Príncipe - Nicolau Maquiavel

Quem criou o termo "os fins justificam os meios"? Se você bateu o olho e pensou em responder Nicolau Maquiavel... bem, você errou. É claro que seu nome vem à mente quando ouvimos essa famosa frase, mas a verdade é que Maquiavel nunca disse isso, bem como é provável que na maioria das vezes em que alguém cita o adjetivo maquiavélico a pessoa esteja fazendo alguma confusão. 

Esse tipo de situação me estimula a pegar alguns livros de Filosofia de vez em quando, simplesmente pelo que diz a etimologia mesmo, "amor à sabedoria", conhecer o pensamento na fonte, e não me deixar levar pelo que se diz por aí. Procuro os considerados clássicos, aleatoriamente ou por circunstância, e dessa vez escolhi O Príncipe, por interesse pela época renascentista suscitado pela série Os Bórgias, na qual, aliás, o personagem de Maquiavel está muito bem construído, apesar de algumas inconsistências históricas - ele aparece em 1494 como diplomata de Florença, quando, na verdade, nessa época ele ainda não tinha entrado para o serviço público.

O Príncipe é um pequeno manual de governo escrito por Maquiavel para Lorenzo II de Médici,  governante de Florença, durante alguns meses de 1513, tempo que passou exilado. Seu objetivo é ensinar preceitos valiosos ao governante para que conquiste e, principalmente, mantenha o poder, formando um Estado forte e sólido. Essa preocupação é bastante justificável, tendo em vista que, naquela época, formavam-se os Estados modernos europeus - Portugal, Espanha, França e Inglaterra, enquanto a Itália permanecia um amontoado de domínios rivais. Nesse ponto residia a principal preocupação de Maquiavel: o fator militar, problema já bem encaminhado nos Estados centralizados, situação que não seria possível ser equiparada pelas cidades italianas com as soluções utilizadas então - forças auxiliares, mercenários, etc. Portanto, um bom governante seria aquele que, primeiramente, fosse capaz de conquistar e manter o poder através das armas.

Nesse ponto, bem como em qualquer outro, o governante deve ser implacável. Aí se encontra a grande inovação que o pensamento de Maquiavel trouxe para a filosofia política do mundo moderno. Não haveria mais espaço para fórmulas de Estados ideais, como por exemplo a República de Platão. Maquiavel apresenta as opções viáveis em seu tempo, diferente dos filósofos anteriores. A partir de então, determina-se a separação entre ética e política (ou, se preferir, uma ética política de uma moral ou ética religiosa), no sentido de que a manutenção do poder é o objetivo principal, e não mais situações utópicas, como uma cidade perfeita governada por filósofos. O governante (o príncipe) deve fazer o que for preciso para manter seu governo. O livro é cheio de exemplos do tipo: determinada atitude é totalmente reprovável, todos concordamos, ninguém deveria fazer isso, porém, às vezes o príncipe tem que fazer, sob o risco de perder o poder. Daí essa história de "os fins justificam os meios", que Maquiavel nunca escreveu em lugar nenhum, e o adjetivo maquiavélico para determinar que alguém é pérfido, malvado, ardiloso, mesmo que seja em situação que nada tenha a ver com filosofia política ou contexto da Itália Renascentista.

Esse é o tema principal de O Príncipe, fazer o que tiver que ser feito para que o poder seja mantido, mas a discussão se aprofunda um pouco mais. Maquiavel não se limita a dizer o que o príncipe deve fazer, mas também como isso deve ser feito. Se baseando em diversos exemplos da história da humanidade, da realidade de seu tempo e de sua própria experiência como diplomata e funcionário público, o autor faz recomendações do tipo, seja amado ou temido, de acordo com a necessidade, mas nunca odiado. Ou também: se for para punir, que essa punição seja definitiva, sem chance de retaliações, mas se for para beneficiar, que se faça aos poucos, para se criar uma expectativa positiva aos beneficiados.

A leitura de O Príncipe tem esse sentido, o de compreender adequadamente este pensamento, tão importante que influenciou diversas personalidades de épocas posteriores, como Napoleão Bonaparte e Benito Mussolini, e teve atenção de pensadores de nossa época como Antonio Gramsci. Não é uma leitura divertida, em certos pontos torna-se até chata por causa dos inúmeros exemplos de obscuras cidades italianas do século XVI, mas de qualquer forma é um livro bem curtinho e pode se começar e terminar no mesmo dia, dependendo de quanto material extra vem na edição - introduções, notas, essas coisas. São diversas as opções, a que li foi a que está presente na épica coleção Pensadores, da editora Abril. O importante é ter alguma leitura de apoio e colocar o livro em seu contexto para que faça sentido e se tire bom proveito dele. 
 
Editora: várias
Páginas: cerca de 200
Disponibilidade: normal
Avaliação: * * *

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