quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Café-da-Manhã dos Campeões - Kurt Vonnegut

Dando continuidade ao meu projeto de ler todos os livros de Kurt Vonnegut, esse que se tornou um de meus heróis da literatura, e provavelmente o autor que mais atrai meu interesse nos últimos anos, tomei para ler um de seus livros mais famosos: Café-da-Manhã dos Campeões, esse título que talvez seja o mais fantástico de todos os tempos - eu pelo menos não canso de repeti-lo como lema depois de noites memoráveis... Bem, apesar desse título profundamente inspirado e inspirador - tirado de um cereal matinal amplamente vendido nos Estados Unidos na época do livro - eu já estava ciente desde o início que essa não seria uma leitura excepcional, já que o próprio autor a classificou como "c", mas ainda assim, para mim, como fã de Vonnegut, ela era vista como essencial, pois apresenta personagens e passagens fundamentais na construção do universo vonnegutiano, principalmente a participação de Kilgore Trout, o escritor de ficção científica que serve de alter ego do autor, como um dos protagonistas da história.

A história se passa em Midland City, a representação ficcional de uma típica cidade do meio-oeste americano (que futuramente vem a ser destruída por uma bomba de nêutrons em Deadeye Dick), e gira em torno de dois personagens: Kilgore Trout, que viaja para lá para receber um prêmio por influência de um milionário que o tira da obscuridade (Eliot Rosewater, outro personagem recorrente em seus livros), e Dwane Hoover, um empresário local que, sabemos logo no início, vai surtar depois de ler uma história de Trout. Como em outros de seus livros, Vonnegut se baseia largamente em suas experiências pessoais e passagens marcantes de sua vida para tecer o enredo com minúcias e bizarrices tão características suas. Nesse caso Vonnegut se baseou especialmente no fantasma de sua mãe suicida, da mesma forma que o horror da Segunda Guerra Mundial foi para Matadouro 5

A narrativa é, em parte, semelhante a de outros livros seus, com a ironia e o deboche como fios condutores de toda a história, apoios para suas críticas contundentes à sua realidade de racismo, preconceito, desigualdade, hipocrisia, mas aqui Vonnegut experimenta ao utilizar desenhos seus espalhados por todo o livro - desenhos simplistas, porém espirituosos, que traduzem bem o humor característico do autor. Também seguindo a linha de seus outros livros, cada detalhe da história consegue agir por si só para estimular a imaginação do leitor numa composição compartilhada da história, uma das coisas que mais me encanta em seus livros.

Tudo o que Vonnegut tem de melhor está nesse livro, os personagens, a ironia, os detalhes encantadores, e nada disso se torna repetitivo quando comparado com seus outros livros. Entretanto, para mim (e acredito que também para o autor quando o classificou como um livro médio) parece que  o que ele não conseguiu dessa vez foi aplicar um ritmo empolgante à narrativa, e sua ironia, apesar de ter o mérito de uma tentativa original conjugada com os desenhos, perde um pouco o tom, talvez exagerando demais aqui. Independente de seus defeitos e deficiências, Café-da-Manhã dos Campeões foi essencial para mim como fã de Kurt Vonnegut e seu universo, e acredito que até para quem não conheça o autor e sua obra possa ser uma leitura agradável, mesmo longe de ser excepcional.

Editora: L&PM
Páginas: 310
Distribuição: normal
Avaliação: * * *

p.s: Em 1999 foi filmada uma versão do livro com Bruce Willis no papel de Dwane Hoover. Vou procurar, por curiosidade, mesmo sabendo que foi considerado pelo próprio Vonnegut como "sofrível"...

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