domingo, 24 de janeiro de 2010

Equador - Miguel Sousa Tavares


Apesar do grande sucesso no meio literário e das muitas críticas elogiosas ao livro de estreia de Miguel Sousa Tavares, eu nunca tinha ouvido falar deste autor e nem tinha ideia do que tratava este livro, tendo em vista que, mesmo lendo bastante, não acompanho muito as novidades do mundo literário, pelo simples motivo: há tanta coisa essencial para ler e tão pouco tempo! Na tentativa de reverter um pouco esta deficiência em minhas leituras, tive ótimas recomendações em relação a este autor de uma pessoa que diz ter passado os dois últimos anos se dedicando intensivamente à leitura de literatura contemporânea africana ou que tratasse da África, e comprei "Equador" num sebo, para verificar o que se passa na literatura mundial hoje em dia.

A ficção histórica em questão se passa no início do século XX, nas ilhas de São Tomé e Príncipe, então colônias portuguesas, no contexto da crise da monarquia portuguesa - que chegou ao fim em 1910. Luís Bernardo Valença, um bon vivant que aproveita o melhor de Lisboa com amigos e mulheres, é convocado pelo rei d. Carlos para uma missão nas ilhas equatoriais: governar as colônias com o objetivo de provar aos ingleses que lá não existe trabalho escravo e, consequentemente, evitar o boicote aos produtos portugueses. Viver numa colônia sem nenhum conforto e longe da agitada vida social a qual estava acostumado e convencer os roceiros das ilhas a modificar o sistema de trabalho em vigência há gerações, mesmo sendo famoso por ter escrito artigos criticando o sistema colonial português, esses são só os desafios iniciais do protagonista.

Ao contrário do padrão de livros desta categoria - muita ação e combates - "Equador" é uma história centrada mais nos pensamentos e sentimentos dos personagens do que nos desenrolar dos acontecimentos, e o resultado é ambíguo: longas partes monótonas onde a leitura se arrasta intercaladas por páginas onde algo realmente acontece, e por isso tão aguardadas e de leitura rápida. Tem-se a impressão inicial que a escrita de Miguel Sousa Tavares é boa e inteligente, o que realmente não deixa de ser verdade, mas com o passar do texto, o estilo rebuscado cansa e dá a impressão de pedantismo. Talvez seja isso que os críticos tenham reconhecido neste autor, ou talvez simplesmente pelo fato dele ser um intelectual famoso em seu país, onde escreve colunas em vários jornais, pois a história em si não tem nada de muito surpreendente, apesar de personagens bem trabalhados - um deles dá margem para um minilivro de 50 páginas dentro do livro, que provavelmente é a parte mais interessante da leitura.

Outro ponto positivo que tenho que considerar é a exploração de uma característica comum a todos os bons livros de ficção histórica, que não falta em "Equador": a exposição do ambiente da época em que se passa a história, particularmente o sentimento português em relação ao seu mundo colonial. Méritos para o autor que, além de desenvolver bem esta característica nos personagens, fez um eficiente trabalho de pesquisa em jornais e livros de pesquisas históricas para retratar os pormenores de Lisboa, das ilhas e da diplomacia do colonialismo.

"Equador" não é um livro ruim, mas está muito aquém do estardalhaço que se fez na época de seu lançamento (2003). Para quem ainda tem uma lista interminável de leituras desejadas, acho que suas pesadas 527 páginas podem ser remanejadas para o final da fila.

Editora: Nova Fronteira
Páginas: 527
Disponibilidade: normal
Avaliação: * * *

Livro Digital


segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Wildcats: Como matar um Wildcat - Joe Casey e Sean Phillips

Na década de 1990, os quadrinhos da Marvel estavam com a bola toda, com desenhistas superstars como Jim Lee, Todd McFarlene e Marc Silvestri. Seus desenhos super-estilizados, uma novidade para a época (mas que logo se transformariam no estereótipo do machão musculoso e da heroína gostosona) faziam certos títulos chegarem à tiragem de milhões (como a famosa minissérie dos X-Men de Jim Lee), e o que eles ganhavam com isso? Salários de desenhistas, nada mais. Nenhuma porcentagem das vendas, nenhum direito sobre personagens criados por eles. Revoltados – e olhando uma mina de dinheiro à frente – os tais desenhistas-estrelas criaram a Image Comics em 1992, editora na qual cada um teria os direitos de suas criações.

Na época de sua criação, a Image Comics nada mais era do que uma cópia das editoras Marvel e DC, com super-heróis no mesmo estilo, alguns grosseiramente copiados. Um grupo destes super-heróis se chamava WildC.A.T.s, criados por Jim Lee, e como todos os outros, era cheio de fortões e gostosonas, sem nada a acrescentar à cultura de ninguém. Essa foi a imagem dos Wildcats que ficou na minha cabeça, por isso nunca tive muito interesse em acompanhar a série. Porém, acho que todo ser tem em si a possibilidade de evoluir – não vê os Beatles, de boys band à maior banda de rock da história? – e visitando fóruns na internet li comentários muito elogiosos a respeito do que os Wildcats haviam se tornado. A informação que recebi foi que um arco havia sido escrito até por Alan Moore, ou seja, Deus – isso não é pouca coisa. Depois dessa, com certeza alguma coisa havia mudado, e isso ficou na minha cabeça.

Certo dia, forçado a uma viagem de ônibus imprevista, sem tempo para preparar o livrinho para ler durante o trajeto, entrei numa banca para pegar alguma coisa que me distraísse – odeio viagens de ônibus! – e me deparei com dezenas de gibis da Panini, daqueles de super-herói com quatro histórias no miolo, três medíocres e uma razoável, todas já iniciadas em outras edições e com o clássico “continua” no final. Já estava preparado para comprar qualquer porcaria melhor do que isso, talvez até aqueles livrinhos eróticos com casais seminus na capa, quando encontrei enterrada no fundo da banca uma edição encadernada de Wildcats, com o selo da quase finada editora Pixel Media – que não costuma publicar besteiróis americanos – e me salvei de algumas horas de tédio infernal.

Realmente tive uma surpresa e pude comprovar como mudou a orientação das histórias destes personagens. A revista em questão se chama “Como matar um Wildcat”, reunindo varias histórias em 160 páginas. Ainda existem reminiscências de quadrinho-espetáculo em algumas partes, mas a maioria da revista é composta por desenhos sombrios e crus, e os temas são mais adultos do que pura pancadaria. A trama é muito interessante, e mesmo eu, que não conhecia quase nada sobre nenhum personagem, pude entender o que se passava.

A primeira história é independente das outras, sobre um personagem chamado Warblade em busca de vingança contra um vilão que matou sua namorada. Desenhos razoáveis de Carlos Meglia (quem?), e roteiro dispensável de Scott Lodbell, nada mais. A trama principal do volume começa mesmo na segunda história. O grupo original se desfez, e um mistério a respeito do chefe do grupo faz com que alguns deste antigos heróis suspeitem estar sendo manipulados e enganados e se juntem para descobrir a verdade. Uma trama muito bem-feita, com personagens bem caracterizados e um final que aparentemente redefine os rumos do grupo. Bom roteiro de Joe Casey e desenhos estilizados e justos de Sean Phillips. No meio da revista há também outra história da fase besteirol americano, tipo um interlúdio sem motivo algum e sem nenhuma ligação com a trama principal, mas nada demais, é só pular algumas páginas.

Terminando a leitura de “Como matar um Wildcat” dá vontade de comprar o próximo volume encadernado, mas com o vergonhoso fim da Pixel Media, infelizmente creio que vou ficar só na vontade mesmo, até que outra editora adquira os direitos sobre o grupo. Os Wildcats mudaram, e pelo que acompanho dos quadrinhos americanos a Image também – a editora não publica mais os personagens bombados de sua fase inicial, e hoje aparentemente seus títulos são mais sérios, com temática adulta. Um brinde à evolução!

Editora: Pixel
Páginas: 160
Disponibilidade: normal (em lojas especializadas)
Avaliação: * * * *